Sobre Clausewitz e uma geografia

Por Yves Lacoste. Tradução de Mario Matos a partir de um texto publicado na revista Hérodote, nº3, julho-setembro, 1976.

Cada vez mais nos interessamos por Karl von Clausewitz (1780-1831) e sua obra principal, Da guerra. Contudo, na época da estratégia de dissuasão nuclear, podem parecer distantes as guerras napoleônicas em que o general prussiano fora agente modesto, mas observador perspicaz.


Por muito tempo, o livro Da guerra foi conhecido – e ainda é – apenas por oficiais superiores alemães e franceses, mas que fizeram bem em manter e seguir Clausewitz sobre os pontos essenciais de seu pensamento, particularmente quando afirma sobre “o armamento do povo” e mostra a importância militar que pode ter “a insurreição popular”. De fato, após o colapso das forças armadas do Antigo Regime sob os ataques de um novo exército, o da revolução, organizado e conduzido por Napoleão, Clausewitz refletiu sobre as causas profundas de sua derrota e nas razões que permitiram a alguns povos, como os da Espanha, resistir vitoriosamente. Para que sua pátria possa repelir o invasor, Clausewitz preconizou até mesmo “a insurreição do povo”, solução que causava espanto à casta dos oficiais.

Depois que Lênin, em 1915, leu Da guerra – e de modo muito atento – alguns marxistas começaram a se referirem a essa obra. Quando observamos, após a tradução do texto chinês dos Escritos militares, que Mao-Tsé-tung (que sem dúvida não leu Da guerra) estava muito próximo das teses de Clausewitz e que as desenvolveu, tanto no plano teórico quanto no da prática militar, o interesse pelas ideias do general prussiano tornou-se evidente, particularmente nos “maoístas” europeus: André Glucksmann, em 1967, escrevera um brilhante Discurso da guerra [1]. Nos meios da intelligentsia, as citações de Clausewitz começaram a ser apreciadas por dar peso aos artigos.

Por outro lado, a guerra do Vietnã, choque de duas forças armadas completamente diferentes, provocou muitos comentários; então veio a “diplomacia” do professor Kissinger, que apresentamos como o último clausewitiano; não tratava a sua tese de doutorado do Congresso de Viena, ou seja, de acontecimentos que Clausewitz vivera e observara?

Ao mesmo tempo, o termo estratégia se torna uma palavra da moda, largamente difundida pela mass media: já se falava em estratégia amorosa, estratégia eleitoral, estratégia financeira, estratégia de desenvolvimento, estratégia de marketing e até de estratégia textual. Mas não se trata apenas da moda: a corrida armamentista jamais conheceu tamanha magnitude, e isso para todos os Estados. Sobre o tabuleiro de xadrez planetário, as duas superpotências se chocam em lutas interpostas, numa série de guerras locais. As ilhotas do Oceano Índico assumem tod